ENTREVISTA

Professor Sardinha crítica a realidade do ensino de SP em Ribeirão Preto

Diretor do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado aponta para falta de estrutura e reconhecimento do ensino de SP na cidade
RIBEIRÃO-PRETO

Em outubro, celebra-se o dia do professor no Brasil. A data é recheada de homenagens, lembranças e gratidão por aqueles que se dedicam a educar e contribuir na formação de uma sociedade pensante, questionadora, resistente e melhor em todos os aspectos.

Longe da ‘factualidade’ do assunto, poucos são os profissionais do ensino que recebem o devido reconhecimento e respeito. A profissão, vista antes como a mais importante da sociedade, hoje está refém da divisão política que toma conta dos ideais brasileiros. Parte ainda continua a enxergar com os antigos olhares, mas porcentagem relevante da população brasileira opta agora pela desvalorização completa dos educadores, e tal ideologia nem sempre termina nas palavras, e acabam em sinistro.

Violência presente

Em 16 de agosto de 2023, na escola municipal profa. Maria Inês Vieira, zona leste de Ribeirão Preto, professoras foram ameaçadas por um pai de aluno que carregava uma arma de fogo. Na abordagem de extrema violência,  a esposa do homem armado também participava, e o casal questionava sobre as práticas e atividades desenvolvidas em sala com suposto conteúdo doutrinário e ideológico. A atividade, de acordo com a APROFERP (Associação de Profissionais da Educação de Ribeirão Preto), aborda conteúdo relacionado ao direito das mulheres, e o homem questionava sobre o governo que teria liberado tal publicação estudantil.

Tal episódio extremista reflete apenas o que essa porcentagem da sociedade brasileira está disposta a fazer contra um profissional da educação. O educador e filósofo brasileiro Paulo Freire, uma das principais figuras relacionada ao ato de educar no mundo, foi totalmente desprezado pelo ex-presidente e seus apoiadores. O pedagogo patrono da educação brasileira foi xingado de energúmeno pelo político, em episódio de 2019.

 

 

Em 25 de outubro, alunos tiveram aulas suspensas após furto da fiação elétrica | foto: Reprodução ; Google Street View

Relato de professor

Em entrevista exclusiva ao blog O Café, o professor Fábio Sardinha, historiador e diretor da APEOESP (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) conta sobre o trabalho em uma escola estadual de Ribeirão Preto.

Qual é a principal dificuldade desses estudantes?

SARDINHA – É algo que me incomoda muito. Como educador, você não tem estrutura para trabalhar e faltar essa estrutura básica que nas escolas particulares tem escola pública deveria ter. Tem dinheiro, né? Na verdade, o dinheiro que tem é mal investido através de parcerias público privadas, que inclusive fazem até material errado no material recentemente e até os slides, né? Que colocava que tinha praia no estado em São Paulo, na cidade de São Paulo, que foi Dom Pedro I que assinou a Lei Áurea, enfim, coisas desse tipo. Um material que foi pago com dinheiro público. Então acho que a principal dificuldade dos estudantes é estudar de fato, né? Sem estrutura, sem acesso para os computadores, falta computador e falta de meios para que o estudante possa desempenhar e desenvolver seu potencial máximo.

A educação estadual completa as necessidades básicas para o desenvolvimento de um indivíduo?

SARDINHA – Na minha opinião, a educação estadual não completa e as necessidades básicas por desenvolver de um indivíduo, ela necessita de mais investimento, de uma melhor estrutura. Aí quando a gente fala de carência na educação pública do Estado de São Paulo, a gente fala de carência, de estrutura mesmo.

Você sempre teve o sonho de ser professor?

SARDINHA – Não, na verdade não. Eu já fiz teatro e quis ser ator. Já fiz jornalismo e acabei me tornando professor. Passei no concurso e fiz história. Então, nem sempre não. Eu tive outros sonhos.

A sua fonte de renda é composta somente pela profissão de professor?

SARDINHA – A minha renda hoje é composta pela profissão de professor.

Como você prepara a aula para os alunos?

SARDINHA – Nós temos o currículo oficial do Estado, então você tem que seguir esse currículo. Por exemplo, eu dou aula no 9* ano. Aí você tem que falar sobre a Guerra Fria no terceiro bimestre que passou e você fala sobre o período, por exemplo. Então você tem todo um cronograma estabelecido com o currículo oficial do Estado e um currículo oficial, aquele conteúdo que você tem que passar, e para preparar a aula eu vou ler o tema. Por exemplo, ao falar sobre a Guerra Fria, eu dou uma estudada sobre esse tema, preparo os slides, vejo alguns vídeos também. Então, sempre que eu vou dialogar com eles sobre um tema eu faço uma pesquisa antes e uso essa temática de slide vídeo. Além da aula expositiva explicativa.

Qual é a faixa etária desses estudantes?

SARDINHA – Eu dou aula para alunos de 14 a 17 anos.

Como é a relação entre professor e aluno em uma escola pública?

SARDINHA – A relação entre professor e aluno em uma escola pública é uma relação de sucateamento, né? Falta ventilador. As salas não são climatizadas, não tem laudo de bombeiro das escolas estaduais. Enfim, não tem segurança, não tem psicólogo. Então, a escola hoje é carente de estrutura para se trabalhar.

Quais são as carências quando se fala na educação pública no estado de São Paulo?

SARDINHA –  As salas de aula estão lotadas com 35, 45 estudantes. Isso já prejudica o aprendizado. Não tem computador para todo mundo, não tem internet. Então, assim, a carência é muito grande.

Professor, existe diferença entre escola pública municipal e estadual?

SARDINHA – A escola municipal é melhor equipada que a escola estadual, sem dúvida. O professor ganha mais também, é melhor remunerado.

Além das óbvias diferenças sociais, o que difere o ensino público do ensino privado?

SARDINHA – No ensino privado, a diferença é que ele visa muitas vezes o lucro. Ele visa a formação daquele jovem para disputar as melhores universidades. Então é essa disputa. O lance de estar trabalhando ele para poder ser uma pessoa que tem a condição de entrar nas melhores universidades. Já na escola pública, ela tem o conceito de formar um cidadão sujeito de direitos, deveres, de saber se relacionar na sociedade, saber e transformar esse conhecimento para transformar essa realidade também, então é formar um cidadão.

Eu, particularmente, prefiro até essa essa forma de trabalhar com o aluno, voltado mesmo para a cidadania, voltado para ele poder compreender que mundo é esse que cerca ele, como ele pode usar o conhecimento para, por exemplo, tornar o mundo um lugar mais justo, mais solidário e um mundo que possa ir e ter desigualdades menores.

A divisão política que acontece atualmente no Brasil impacta a sua rotina como professor estadual?

SARDINHA – A divisão política não sei se impacta. Pelo menos, onde eu dou aula não impacta assim. Quando era o outro governo e tinha corte de verbas do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) tinha ameaças.

 

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